Troop Zero, um filme para adultos aprenderem com as crianças.

Juliana Ferreira
4 min readAug 2, 2021

O ano é 2021 e ainda temos discussões sobre o que é presente de menina ou de menino, ou até mesmo que cor cada um pode ou não usar. Mesmo que tenhamos avançado um pouco, infelizmente ainda nos deparamos também com tantas crianças sofrendo bullying, seja pelo seus gostos, ou pelo seu tom de pele, peso ou deficiências.

Isso em 2021, imagine na década de 70. Época em que se passa o filme Troop Zero,estrelado por Viola Davis, Allison Janney e McKenna Grace. Nele as crianças se juntam em um grupo de escoteiros para participar de um concurso onde o prêmio é enviar mensagens para o espaço, pela NASA.

Pelo nome que é dado ao grupo, “a Tropa Zero”, já podemos perceber como essas crianças eram excluídas e ditas como “estranhas”. A tropa zero, “nulo”, como se não valessem nada.

A personagem principal, mesmo sendo uma menina magra e branca, é vista como “a estranha” porque gosta de astronomia. Seu nome soa “estranho”, para mostrar o quão diferente ela é; “Christmas”, significa “Natal” em Inglês. Ela é quem mais sobre bullying em todo o filme, mas nunca perde a esperança e não desiste das coisas que gosta. Ela era a criança mais empolgada pelo prêmio final. A líder dos excluídos. Uma menina que teria tudo pra ser bem triste, mas que é bem positiva. Quando recebem o nome de “tropa zero”, ela abre um sorriso e fala “ zero é número do infinito” e surpreende quem achou que iria humilhá-la.

O filme aborda questões bem complexas de modo bem leve. Temas como machismo, morte e bullying, são colocados junto com histórias de superação e sobre empatia e amizade. E como os adultos aprendem as coisas sob a perspectiva de crianças que mesmo tão novas, já viveram coisas tão desafiadoras.

Dentre vários personagens, gostaria de falar sobre 3 deles. Uma criança negra, uma criança gorda e um menino que não gosta de fazer coisas de “menino”.

Bem, começando pela criança negra, a Hell-No Price ,uma criança que é chamada por um apelido bem peculiar e que aparentemente vive sozinha, já que seus pais nunca aparecem. Ela é a “chefe da gangue”, uma menina agressiva e que usa da agressividade para se proteger.

Ela é chamada pra se juntar ao grupo, e tem um momento muito forte quando eles perdem uma etapa de um desafio e pensam em desistir, e ela fala que preferia não ter vivido toda aquela situação, e que preferia voltar pra vida dela normal onde aquele sonho não existia. Isso nos mostra que aquela criança pode ter ouvido muito na vida dela o quanto ela era “incapaz” de realizar seus sonhos, e que era melhor não tê-los.

O mesmo acontece com sua única amiga, a Smash, uma menina gordinha que durante todo o filme não deve ter mais de 5 falas…e entre elas, obviamente usando o estereótipo que define uma menina gorda, ela fala sobre comida. Smash, que significa esmagar, em Inglês, está sempre gritando e com raiva, quebrando tudo o que vê pela frente.

Todas as crianças, em um desafio durante a competição, precisam mostrar um talento pra ganhar uma medalha, e ela , que sabia quebrar as coisas, foi chamada pra consertar um rádio. Pouco se fala sobre ela e é uma personagem que não tem um crescimento, apensar de conquistar sua medalha.

Sobre o menino, a evolução do seu personagem é feita de modo mais interessante. Joseph tem nome, tem pai e irmãos . No começo o pai tenta fazer com que ele jogue futebol, mas ele nitidamente não tem interesse por coisas ditas como “masculinas”. Ele gosta de cuidar do cabelo da amiga e de dançar.

É tratado no filme o tempo todo com frases como “nem é menina, mas também não é menino’, e sua amizade com a personagem principal é bem forte e em um momento que eles se desentendem , a cumplicidades deles é tão legal que eles se entendem de forma muito sutil.

Embora sofra bullying, e seu pai no começo tente fazê-lo jogar futebol, ele é o personagem que mais se destaca,depois da protagonista. Joseph encontra um hobby, tem referências e gostos musicais. Seu pai em nenhum momento mostra resistência e seu lado artístico é incentivado e aplaudido, tudo muito natural e leve.

E é assim que as crianças deveriam ser tratadas, tendo suas individualidades respeitadas.

Espero que em um futuro não muito distante, as pessoas possam ter a liberdade de ser quem elas quiserem. Que meninas não sejam consideradas “estranhas” por gostarem de estudar sobre planetas, ou os meninos que gostam de dançar.

E que da mesma forma que foi natural mostrar um menino gostando de coisas que eram ditas como “de menina”, que pessoas negras e gordas quando forem retratadas em filmes, não representem estereótipos de pessoas difíceis de conviver ou que “só” pensam em comida.

Joseph, tinha como ídolo, David Bowie. Uma referência que além da parte musical, já lhe trazia a representatividade de se reconhecer em alguém. Christmas, tinha o incentivo do pai, que mesmo com todas as dificuldades, e mesmo dizendo não, fazia isso de forma delicada.

As crianças desse filme nos mostram como pessoas tão diferentes podem se respeitar e conviver com suas diferenças e serem amigas. Como laços de amizade transformam as pessoas e que cada ser humano é único. Todos possuem habilidades e qualidades, que todo mundo merece uma segunda chance e uma oportunidade.

E por fim, tem uma frase que mais me marcou no filme, onde a treinadora do grupo rival da competição pergunta para o pai de Christmas

“ Que mundo seria este se cada garota esquisita pensasse que poderia fazer o que quisesse? ”.

Com certeza seria um mundo melhor. Um mundo onde cada criança possa acreditar em si , e acreditar que pode mudar o mundo.

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